O antigo Clube de Leitura em Voz Alta deu lugar ao Coro de Leitura em Voz Alta. Tem normalmente um periodicidade quinzenal e acontece na Biblioteca de Alcochete.

Os objectivos continuam a ser os mesmos; promover o prazer da leitura partilhada; a forma passou a ser outra.

próxima sessão | 10 Fevereiro 2015

será o tema
***ATENÇÃO```
os textos serão obrigatoriamente humorísticos
e preferencialmente lidos em grupo

apresentará o livro do dia

paixão

com o tema "Paixão" e com textos teatrais (nem todos) se passou a noite

hoje falámos de técnicas para tornar uma leitura eficaz

e praticámos com um excerto de "A noite das mulheres cantoras" de Lídia Jorge

Sabes o que queremos? Queremos vencer encantando, seduzindo. Tão simples quanto isto, não to escondemos. Queremos encantar pessoas, milhares, milhões de pessoas. Queremos ser maiores do que cada uma delas e do que todas no seu conjunto, queremos ter uma habilidade que elas não têm. Queremos entrar-lhes pelos ouvidos, pelos olhos, pelos nervos, pelo corpo todo. Entendes? Por isso, elas vão ficar paradas, à espera, e nós na sua frente, seduzindo-as, colando-as aos seus lugares, hipnotizando-as, desvairando-as com o nosso talento. Plateias, salas inteiras, recintos repletos de gente submetida por encantamento à nossa música. Queremos o mundo. Queremos fazer amor com o mundo, entregando-lhe a nossa música e recebendo em troca tudo o que o mundo tem para nos dar. Só isso. Nós não temos medo das palavras. A música serve para isso. É isso que queremos, quem não entender não serve para esta função. A pergunta que eu te faço é a seguinte - Queres sair desse local absurdo, onde te escondes feita um bichinho mudo, para te mostrares e vires connosco? Para vires à luta e encantares pessoas? Responde.










"Por quem os sinos dobram" de Ernest Hemingway

e entrámos nas leituras subordinadas ao tema da sessão

a Ana e a Luísa leram um excerto de
"Dom João no jardim das delícias" de Norberto Ávila


a Teresa leu de Sophia de Mello Breyner Andresen
E só então saí das minhas trevas:
Abri as minhas mãos como folhagens,
Intacta a luz brotava das paisagens,
Mas na doçura fantástica das coisas
As minhas mãos queimavam-se e morriam.

Dia perfeito, inteiro e luminoso,
Dia presente como a morte, luz
Trespassando os meus olhos de cegueira.
Cada voz, cada gesto, cada imagem
Na exaltação do sol se consumia.

de "Coral"



a Maria João leu de Herberto Hélder
Não sei como dizer-te que a minha voz te procura
e a atenção começa a florir, quando sucede a noite
esplêndida e casta.
Não sei o que quer dizer, quando longamente teus pulsos
se enchem de um brilho precioso
e estremeces como um pensamento chegado. quando,
iniciado o campo, o centeio imaturo ondula tocado
pelo pressentir de um tempo distante,
e na terra crescida os homens entoam a vindima
- eu não sei como dizer-te que cem ideias,
dentro de mim, te procuram.

Quando as folhas de melancolia arrefecem com astros
ao lado do espaço
e o coração é uma semente inventada
em seu ascético escuro e em turbilhão de um dia,
tu arrebatas os caminhos da minha solidão
como se toda a minha cara ardesse pousada na noite.
- E então não sei o que dizer
junto à taça de pedra do teu tão jovem silêncio.
Quando as crianças acordam nas luas espantadas
que às vezes se despenham no meio do tempo
- não sei como dizer-te que a pureza,
dentro de mim, te procura.

Durante a primavera inteira aprendo
os trevos, a água sobrenatural, o leve e abstracto
correr do espaço
e penso que vou dizer algo cheio de razão,
mas quando a sombra cai da curva sôfrega
dos meus lábios, sinto que me falta
um girassol, uma pedra, uma ave qualquer
coisa extraordinária.
Porque não sei como dizer-te sem milagres
que dentro de mim é o sol, o fruto,
a criança, a água, o leite, a mãe,
o amor,

que te procuram.

excerto do poema "Tríptico" de "A Colher na Boca"


a Maria leu um excerto de
"Romeu & Julieta" de William Shakespeare


o Luís leu um excerto de
"Cyrano de Bergerac" de Edmond Rostand
CYRANO: Um beijo! A palavra é doce. Não vejo por que os seus lábios recuam;
Que faz um beijo? Ele queima? Oh! Não deixe a sua timidez amedrontá-la;
Não passou todo este tempo a deixar os gracejos de lado, insensível, indo, com destemor, do sorriso ao suspiro - do suspiro ao choro?
Escorregue gentilmente, imperceptivelmente, adiante. - da lágrima ao beijo - um momento de terror! - um batimento cardíaco!

ROXANE: Silêncio! Silêncio!

CYRANO: Um beijo quando tudo já foi dito - o que é? Um juramento ratificado - uma promessa selada, uma confissão do coração pedindo para ser confirmada - um botão de rosa no ‘i’ de ‘paixão’- um segredo que à boca, não ao ouvido, é sussurrado - pincel de asa de abelha que faz o tempo eterno - comunhão perfumada, como as flores fogosas da primavera - alívio ao peito opresso, quando a inundação que se forma na alma transborda aos lábios!

ROXANE: Silêncio! Silêncio!

CYRANO: Um beijo, Madame, é honroso: A rainha de França, ao seu maior favorito concedeu um beijo - a própria rainha!

ROXANE: Como assim?

CYRANO (falando calorosamente): Buckingham sofreu em silêncio, - assim fui eu, - adorando sua rainha tão lealmente quanto eu - foi triste mas… fiel – assim como eu…


a Gabriela leu um excerto de
"Os três casamentos de Camila S." de Rosa Lobato de Faria


a Ilda leu de António Feijó
 Dois! Eu e Tu, num ser indispensável! Como
Brasa e carvão, centelha e lume, oceano e areia,
Aspiram a formar um todo, — em cada assomo
A nossa aspiração mais violenta se ateia...

Como a onda e o vento, a Lua e a noite, o orvalho e a selva
— O vento erguendo a vaga, o luar doirando a noite,
Ou o orvalho inundando as verduras da relva —
Cheio de ti, meu ser de eflúvios impregnou-te!

Como o lilás e a terra onde nasce e floresce,
O bosque e o vendaval desgrenhando o arvoredo,
O vinho e a sede, o vinho onde tudo se esquece,
— Nós dois, de amor enchendo a noite do degredo,

Como partes dum todo, em amplexos supremos
Fundindo os corações no ardor que nos inflama,
Para sempre um ao outro, Eu e Tu, pertencemos,
Como se eu fosse o lume e tu fosses a chama...

de "Sol de Inverno"



a Celina leu um excerto de
"A surpresa do amor" de Pierre de Marivaux


o Renato leu um excerto de
"A voz humana" de Jean Cocteau


a Ana Maria, a Virgínia e a Margarida leram de correspondência entre
Fernando Pessoa e Ophélia
Meu bebé pequenino
Então o meu Bébé fez-me uma careta quando eu passei?
Então o meu Bébé, que disse que me ia escrever hontem, não me escreveu?
Então o Bébé não gosta do Nininho? (Não é por causa da careta, mas por causa de não escrever)
Olha, Nininha; e agora a serio: achei que tinhas um ar alegre hoje, que mostravas boa disposição. Também pareces ter gostado de ver o Ibis, mas isso não garanto, com medo de errar.
Ainda fazes muita troça do Nininho? (A. de C.).
Não sei se irei amanhã a Belem; o mais provavel, como te disse, é que vá.
Em todo o caso, já sabes: depois das 6.30 não appareço, de modo que escusas de esperar pelo Ibis para alem d’essa hora.
Ouvistaste? [sic]
Muitos beijos e um abraço á roda da cintura do Bébé.
Sempre e muito teu
Fernando
6.5.1920

Nininho da minha alma
[Postal ilustrado]
8/5/1920
Nininho da minha alma:
Cheguei agora de minha irmã, são quase 11 horas e vou-me já, já, deitar porque estou
moidíssima. Gostei da tua cartinha do 6 e fiquei com pena de não ter mais, hoje mandei uma pequena à minha casa para saber se lá tinha alguma carta, mas não tinha nada. Porque não escreveste [,] mau mau? Ai Álvaro de Campos [,] A. de C. [,] então eu faço troça do Nininho?
Podes garantir porque não erras, realmente no Domingo estava bem disposta e alegre e gostei imenso mesmo de ver o meu Ibizinho. E a prova que estou bem disposta é que cosi todo o dia.
Amanhã espero-te em Belém, não faltes não? E vai cedinho que é para eu não esperar muito, se eu antes das 6 ½ não estiver lá não te admires [,] é porque ainda não saí, e não porque me tenha ido embora, eu espero até às 6 ½. Eu afinal parece-me que fico de todo com a minha irmã quando o meu cunhado se for embora.
Não Nininho [,] eu não gosto de si, mas eu no Sábado escrevi, mas não tinha selos e juntei com a de Domingo como viste.
Vou já fazer óó, tu não queres vir?, não gostas do bebé... Adeus amor até amanhã.
Apaixonados jinhos da tua
Ofélia

Bébézinho do Nininho-ninho
Oh!
Venho só quevê pâ dizê ó Bébézinho que gostei muito da catinha d’ella. Oh!
E tambem tive munta pena de não tá ó pé do Bébé pâ le dá jinhos.
Oh! O Nininho é pequinininho!
Hoje o Nininho não vae a Belem porque, como não sabia s’havia carros, combinei tá
aqui ás seis o’as.
Amanhã, a não sê qu’o Nininho não possa é que sahe d’áqui pelas cinco e meia (1)
(isto é a meia das cinco e meia).
Amanhã o Bébé espera pelo Nininho, sim? Em Belem, sim? Sim?
Jinhos, jinhos e mais jinhos
Fernando
31/05/1920
(1) No original, há aqui o desenho de uma meia.


o Fernando e a Cristina leram um excerto de
Guerras do alecrim e manjerona  de António José da Silva
(...)

Fagundes: E bom sumiço! Aonde estarão estas meninas, que há mais de quatro horas que foram à Missa, e ainda não há rumo delas? Meu senhor, vossa mercê acaso veria por aqui duas mulheres com uma criada?

Dom Fuas: Que sinais tinham?

Fagundes: Tinha uma delas uns sinais pretos no rosto, e a outra uns sinais de bexigas.

Dom Fuas: E que mais?

Fagundes: Uma delas tem os olhos verdes, cor de pimentão, que não está maduro, e a outra olhos pardos, como raiz de oliveira; uma tem cova na barba, e a outra barba na cova, uma tem espinhela caída, e a outra um leicenço num braço.

Dom Fuas: Com esses sinais, nunca vi mulher nesta vida.

Fagundes: Meu senhor, uma delas trazia um ramo de Alecrim no peito, e a outra de Manjerona.

Dom Fuas: Vi muito bem, que são as sobrinhas de Dom Lancerote.

Fagundes: Essas mesmas são: ora diga-me, aonde as viu?

Dom Fuas: Promete vossa mercê fazer-me quanto lhe eu pedir?

Fagundes: Ai, que coisa me pedirá vossa mercê, que lhe não faça, dizendo-me aonde estão as minhas meninas?

Dom Fuas: Pois descanse, que elas aqui estiveram, e agora foram para casa.

Fagundes: Ai, boas novas tenha.

Dom Fuas: Ora, pois, em alvíssaras desta boa nova quero me diga como se chama...

Fagundes: Eu? Ambrósia Fagundes, para servir a vossa mercê.

Dom Fuas: Digo, como se chama a que trazia a Manjerona no peito?

Fagundes: Chama-se Dona Nize.

Dom Fuas: Pois, Senhora Ambrósia Fagundes, saiba que eu adoro tão excessivamente a Dona Nize, que em prémio do meu extremo me franqueou este ramo de Manjerona.

Fagundes: É verdade, que pelo cheiro o conheço, que é o mesmo.

Dom Fuas: E como me dizem os impossíveis, que há de a poder comunicar, quisera dever-lhe a galantaria de ser minha protectora nesta amorosa pretensão; e fie de mim, que o prémio há de ser igual ao meu desejo.

Fagundes: Meu senhor, difícil empresa toma vossa mercê; porque além da excessiva cautela do tio, que nisto não se fala, uma delas está para casar com um primo, que hoje se espera de fora da terra, e a outra qualquer dia vai a ser freira; com que, meu senhor, desengane-se, que ali não há que arranhar.

Dom Fuas: E qual delas é a que casa?

Fagundes: Ainda se não sabe; porque o noivo vem à escolha daquela que lhe mais agradar.

Dom Fuas: Como o vencer impossíveis é próprio de um verdadeiro amante, nós havemos intentar esta empresa, saia o que sair; que a diligência é mãe de boa ventura: favoreça-me vossa mercê, Senhora Fagundes, com o seu voto, que eu terei bom despacho no tribunal de Cupido; tenho dinheiro e resolução, e tendo a vossa mercê da minha parte, certo tenho o triunfo da Manjerona.

Fagundes: Pois por mim não se desmanche a festa, que eu não sou desmancha-prazeres; esta noite o espero debaixo da janela da cozinha; sabe onde é?

Dom Fuas: Bem sei.

Fagundes: Pois espere-me aí, que eu lhe direi o que há na matéria.

Dom Fuas: Deixe-me beijar-lhe os pés, ó insigne Fagundes, feliz correctora de Cupido.

Fagundes: Ai! Levante-se, senhor, não me beije os pés, que os tenho agora mui suados e um tanto fétidos; descanse, senhor, que Dona Nize há de ser sua apesar das cautelas do tio, e das carícias do noivo.

Dom Fuas: Se tal consigo, não tenho mais que desejar.

(...)

e para terminar...

próxima sessão | 27 Janeiro 2015

será o tema
***ATENÇÃO***
os textos deverão, obrigatoriamente, ser de TEATRO

À Barca!

a foto de família, depois da festa


mas a família desta vez foi bem maior:

À BARCA!

Pesquisa e Guião – Cristina Paiva

Encenação – Cristina Paiva e Fernando Ladeira

Produção – José Luís Grilo e Andante

Textos – António Rei, Bernardim Ribeiro, Damião de Góis, Erasmo de Roterdão, Fernão Mendes Pinto, Gil Vicente, João Ruiz de Castel Branco, Luís de Camões, Sá de Miranda

“Maestrina” – Cristina Paiva

Coro leitor – Adília Silva, Ana Brandão, Ana Maria Tavares, Ana Maria Vieira, Anabela Labreca, Antónia Batalha, António Soares, Cíntia Mendes, Conceição Aguiar, Cristina Alves, Daniel Guerra, Eugénia Casadinho, Gabriela Maduro, Helena Barros, Ilda Albuquerque, Isabel Moisés, Luís Correia, Manuel Aguiar, Margarida Martins, Maria Abelha, Mariana Tomás, Paulo Machado, Renato Ribeiro, Rosa Almeida, Vitória Roque

Crianças do 5º H – Afonso Pereira, Ana Raquel Simões, Andrei Ratá, Carolina Alves, Catarina Jalles, Daniel Rodrigues, Diogo Sousa, Diogo Campos, Helena Santos, João Gomes, Lauro Rodrigues, Luana Sobral, Madalena Antão, Maria Pereira, Mariana Borges, Miguel Ciupac, Raquel Marques, Rodrigo Gomes, Samuel Serra, Sara Figueiredo, Sofia Paiva, Tânia Cumpanasoiu, Tomás Brandão, Tomás Paitio

Música – Juan del Encina
Arranjos musicais – Maestro António Menino
Músicos – António Menino,…
Tenor – Bruno Almeida

Concepção plástica – Cíntia Mendes
Costureira – Antónia Batalha
Confecção de adereços – Alexandra Ferreira, Cíntia Mendes, Margarida Martins

Música – Juan del Encina
Arranjos musicais – António Menino
Músicos – António Menino (clarinete soprano), Diogo Cocharra (clarinete soprano), Ricardo Piçarra (percussões), Rui Cocharra (clarinete baixo) e Tiago Menino (clarinete soprano)
Tenor – Bruno Almeida

Conceção plástica – Cíntia Mendes
Costureira – Antónia Batalha
Confeção de adereços – Alexandra Ferreira, Cíntia Mendes, Margarida Martins

Coreografia – Bruno Rodrigues
Bailarinos – Adelino Lourenço, Beatriz João, Débora Gago, Inês Reis, Nádia Fernandes, Patrícia Macedo

Bailadores – Catarina Lourenço, Cila Gonçalves, Fábio Gonçalves, Fátima Martins, Marisa Peixinho, Miguel Melo, Patrícia Martins, Rúben Cardoso, Rui Faria, Vanessa Hipotecas
Director técnico – Arsénio Ferreira

Som e Luz – Fernando Ladeira e Ricardo Tavares

Agradecimentos – Professoras Celina Mendes, Helena Barros, Paula Simões e Sónia Santos

áfrica



a Cristina começou por ler-nos um pouco de "O prazer da leitura" de Marcel Proust


de seguida trabalhámos dicção

e as leituras do tema da sessão:

a Cristina e o Fernando leram um excerto de "A relíquia" de Eça de Queiroz


a Maria, a Alexandra e a Patrícia leram um excerto de "Os Lusíadas" de Luís de Camões


a Maria João leu um excerto de "Chuva Braba" de Manuel Lopes


a Ana Maria leu de João de Deus
Versão Zulu

Rainha Jacinta foi
dar uma tarde passeio,
quando mestre Ginga veio
assanhado como um boi;
e diz a Jacinta: – “Dói
ver que estás tão insensata;
em dia que a onda bata
assim com a força desta,
só sendo pessoa besta,
só sendo pessoa gata,
vem à praia fazer festa
sem medo de água que mata.”

Mas vai rainha Jacinta,
que tem bestunto e tineta,
cuida que Ginga diz peta,
cuida que Ginga lhe minta;
e diz ao Ginga: – “Consinta
ou não consinta o sinhora,
Jacinta vai praia fora,
buscando concha encarnada;
atrás de mim vem soldada,
vem gente que toda a hora
que me veja atrapaiada,
deita logo calça fora,
rainha Ginga é pescada.”

Mal sabia gente preta,
mal cuidava (triste dia!),
ver Jacinta numa pia
mais funda que uma gaveta!
Corre o gente todo inquieta,
rainha Ginga estrebucha;
foi obra dalguma bruxa
ir esticando a canela!
Gente preta pega nela,
preto larga, preto puxa;
mãe Jacinta volta a ela,
pai Ginga dança cachucha.

Jacinta é condecorada
com berliques de pendura
e faz bonita figura
com sua fita bordada,
com sua fita encarnada,
da cor que pretinho gosta;
fita maior que lagosta,
fita maior que pescada:
em n’a pondo atravessada,
rainha Ginga, bem posta,
pretinho bate palmada:
“- Viva Jacinta da costa!
Viva Jacinta pescada!”


o Luís leu excerto de "Carta a Guerra Junqueiro"
de Eça de Queirós, de Correspondência de Fradique Mendes
V. porém dirá (e de facto o diz): «Tornemos essa comunicação puramente espiritual, e que, despida de toda a exterioridade litúrgica, ela seja apenas como o espírito humano, falando ao espírito divino». Mas para isso é necessário que venha o Milénio — em que cada cavador de enxada seja um filósofo, um pensador. E quando esse Milénio detestável chegar, e cada tipóia de praça for governada por um Mallebranche, terá V. ainda de ajuntar a esta perfeita humanidade masculina, uma nova humanidade feminina, fisiologicamente diferente da que hoje embeleza a Terra. Porque enquanto houver uma mulher constituída física, intelectual e moralmente como a que Jeová, com uma tão grande inspiração de artista, fez da costela de Adão, — haverá sempre ao lado dela, para uso da sua fraqueza, um altar, uma imagem e um padre. 
Essa comunhão mística do Homem e de Deus, que V. quer, nunca poderá ser senão o privilégio duma élite espiritual, deploravelmente limitada. Para a vasta massa humana, em todos os tempos, pagã, budista, cristã, maometana, selvagem ou culta, a Religião terá sempre por fim, na sua essência, a súplica dos favores divinos e o afastamento da cólera divina; e, como instrumentação material para realizar estes objectos, o templo, o padre, o altar, os ofícios, a vestimenta, a imagem. Pergunte a qualquer mediano homem saído da turba, que não seja um filósofo, ou um moralista, ou um místico, o que é Religião. O inglês dirá: — «É ir ao serviço ao domingo, bem vestido, cantar hinos». O hindu dirá: — «É fazer poojah todos os dias e dar o tributo ao Mahadeo». O africano dirá: — «É oferecer ao Mulungu, a sua ração de farinha e óleo». O minhoto dirá: — «É ouvir missa, rezar as contas, jejuar a sexta-feira, comungar pela Páscoa». E todos terão razão, grandemente! Porque o seu objecto, como seres religiosos, está todo em comunicar com Deus, e esses são os meios de comunicação que os seus respectivos estados de civilização e as respectivas liturgias que deles sairam, lhes fornecem. Voilà! Para V., está claro, e para outros espíritos de eleição, a Religião é outra coisa — como já era outra coisa em Atenas para Sócrates e em Roma para Séneca. Mas as multidões humanas não são compostas de Sócrates e de Sénecas — bem felizmente para elas, e para os que as governam, incluindo V. que as pretende governar! 
De resto, não se desconsole, amigo! Mesmo entre os simples há modos de ser religiosos, inteiramente despidos de Liturgia e de exterioridades rituais. Um presenciei eu, deliciosamente puro e íntimo. Foi nas margens do Zambeze. Um chefe negro, por nome Lubenga, queria, nas vésperas de entrar em guerra com um chefe vizinho, comunicar com o seu Deus, com o seu Mulungu (que era, como sempre, um seu avô divinizado) . O recado ou pedido, porém, que desejava mandar à sua Divindade, não se podia transmitir através dos Feiticeiros e do seu cerimonial, tão graves e confidenciais matérias continha... Que faz Lubenga? Grita por um escravo: dá-lhe o recado, pausadamente, lentamente, ao ouvido: verifica bem que o escravo tudo compreendera, tudo retivera: e imediatamente arrebata um machado, decepa a cabeça do escravo, e brada tranquilamente — «parte»! A alma do escravo lá foi, como uma carta lacrada e selada, direita para o Céu, ao Mulungu. Mas daí a instantes o chefe, bate uma palmada aflita na testa, chama à pressa outro escravo, diz-lhe ao ouvido rápidas palavras, agarra o machado, separa-lhe a cabeça, e berra: — «Vai!» Esquecera-lhe algum detalhe no seu pedido ao Mulungu... O segundo escravo era um pós-escrito...
Esta maneira simples de comunicar com Deus deve regozijar o seu coração. Amigo do dito. — FRADIQUE


a Gabriela leu de Luísa Ducla Soares
Negra

Vós chamais-me moreninha
Mas eu morena não sou,
Sou tão negra como a noite
E a estrada por onde vou.

Tenho olhos de azeitona,
Minha pele é de pantera,
Meu corpo tem um traçado
Ágil e negro de fera.

Negra África me corre
Dentro das veias, num rio.
Só o meu sorriso é branco
Como as velas dum navio.

Não me chamem moreninha
Porque eu morena não sou,
Sou negra como o orgulho
De ser aquilo que sou.


o Renato leu um excerto de "O coração das trevas" de Joseph Conrad


a Virgínia e a Celina leram "A serpente de Olumo",
conto da tradição oral da Nigéria, de "Contos Nigerianos"


a Ilda também leu um excerto de "O coração das trevas" de Joseph Conrad


a Margarida leu um excerto de "Os Lusíadas", Canto V de Luís de Camões


a Teresa leu de Henrique Teixeira de Sousa
Entre gente de sobrado, de loja e de funco, nasci e vivi.
Nunca cheguei a perceber bem qual o lugar me coube nessa sociedade.
Por isso, este livro é de todos e para todos.

A igreja estava apinhada de gente. Não de gente que viesse toda ao funeral de Nha Caela. Gente, sim, que estava ali, na maioria, para assistir à missa grande do dia de S. Lourenço. Desde o altar-mor até cá fora à entrada quase não havia lugar para cair uma agulha, tantos eram os pés e os joelhos que cobriam o chão. No meio da igreja, numa rodinha que pouco mais era que o espaço para meia dúzia de covas de milho, descansava o caixão de Nha Caela. Quatro castiçais de bronze ladeavam o esquife. As velas de cera ardiam serenamente, dir-se-ia a alma bondosa da finada evolando-se da terra. Bafo morno pairava no ambiente de mistura com o cheiro a podridão que vinha do corpo da defunta. Mas isso não impedia que mais pessoas procurassem furar a multidão para se instalarem pertinho dos castiçais. Nem mesmo se sabia quando findavam os apertões e de que maneira o padre Afonso havia de realizar as exéquias. Logo foi ela morrer na véspera de S. Lourenço e escolher precisamente aquela igreja para receber o ofício fúnebre, no dia 10 de Agosto, dia do orago da freguesia. Bem podia ser enterrada na cidade, onde de resto residia a maior parte do ano. Mas morreu no sobradão de Ilhéu de Contenda, e assim deixara recomendado ao filho Eusébio, caso fechasse os olhos na sua casa de campo, que a sepultassem no cemitério de S. Lourenço, ao lado do amado esposo. Muito nutrida e pesada, não foi sem alguma dificuldade que transportaram o corpo até à igreja, debaixo de um sol de rachar. O camião, que devia vir de S. Filipe para acarretar o caixão, teve dois furos e ficou parado por altura de Cutelo Comprido. Quando o ajudante do camião chegou suado ao sobradão para informar Nhô Eusébio da avaria, este já havia recrutado oito homens para levar o esquife, que agora estava a ser desrespeitado pelos festeiros, e donde exalavam os odores fétidos que empestavam a igreja. Até pingava líquido pútrido por baixo, saído talvez dos orifícios naturais. Não era para admirar, com o calor que fazia. Calor prenunciando mais chuva. Desde 20 de Julho que chovia a bom chover. Nunca se vira ano agrícola que começasse com tanta chuva. Quase todos os dias caía água do céu. Por isso, andava tudo verde, do mar até à serra. Forçosamente que seria um ano farto.

excerto de "Ilhéu da Contenda"


o Tomás leu o prólogo de "A cabana do pai Tomás" de Harriet Beecher Stowe

Este relato refere-se a uma raça de homens nascidos sob o sol dos trópicos, uma raça resignada, heróica e abnegada ao longo de muitos anos – a raça de cor, a raça negra -, embora já se vislumbre, clareando na distância de um belo horizonte, o amanhecer de melhores dias. Foi a influência díspares, tendendo a converter em maravilhosa realidade a máxima do Cristianismo: «Amai-vos uns aos outros.»                                   
Surge na mente da autora deste livro a recordação da África, o malfadado continente que constituiu o primeiro degrau da grandiosa escadaria que conduzia à civilização ao progresso nos primeiros alvores de uma humanidade que ainda permanecia adormecida na noite dos tempos – essa África que, após muito século de horrível escravidão, lança agora no espaço, se bem que ainda em vão, o seu angustioso apelo de liberdade. Talvez por isso, a raça dominante tenha entendido finalmente que nunca é tarde para se abrir à compreensão e à convivência cordial, começando a franquear o coração à piedade, serenamente convencida que é muito mais nobre proteger a pária a escravizá-lo extenuá-lo com o rigor da mais infame das desditas humanas. Graças, pois, ao céu, por haver permitido que o mundo pudesse sobreviver à traficância dos negros!



a Luísa e a Ana leram um conto tradicional do Burkina Faso "O belo negro"


a Gabriela apresentou "Capitãs de Abril" de Ana Sofia Fonseca como livro do dia


e para terminar... entre outras iguarias tivemos Fogaças de Palmela
 Fogaças de Palmela

500 g de pão em massa; 500 g de açúcar amarelo; 1 kg de farinha; 125 g de banha; 2 ovos + 1 ovo para pintar; sumo de 2 laranjas; raspa de 1 laranja; aguardente; canela; erva-doce

Ligam-se os ovos ao pão em massa. Juntam-se em seguida, o sumo e raspa das laranjas, a banha, o açúcar, a canela, a erva-doce, a aguardente e por fim a farinha. Depois de tudo bem ligado e amassado deixa-se levedar durante 30 minutos. Moldam-se várias formas, como animais, corações, pés, mãos, cachos de uva,..., e pintam-se com ovo batido. Vai a cozer em tabuleiro untado em forno moderado.

Nota: Poderá levar um pouco mais de farinha, dependendo do tamanho dos ovos e das laranjas para que a massa tenha uma consistência que a permita moldar. A erva-doce e a canela são a gosto, no entanto a quantidade de erva-doce deverá ser sempre superior à da canela. Pode não levar raspa de laranja, mas sim de limão.

próxima sessão | 13 Janeiro 2015

será o tema
***ATENÇÃO***
as leituras deverão, preferencialmente, ser feitas em grupo
e os textos deverão, obrigatoriamente, ser de AUTORES CLÁSSICOS

apresentará o livro do dia

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